Valente, Vasco Pulido (2007) "A princesa do povo". Público. 25 de Agosto
"Há 25 anos, por estranho que pareça, a Monarquia Britânica (britânica, não inglesa)
era ainda uma instituição respeitável, e relativamente imune às pressões para se
"modernizar". Essa respeitabilidade impunha, entre outras coisas, que o príncipe de
Gales se casasse com uma virgem. Porquê? Para que ninguém a seguir se viesse
gabar pelos tablóides de que tinha dormido com a futura rainha (ou mesmo, se Isabel
morresse, com a rainha) e descrever coloridamente a coisa. Quando, para garantir a
sucessão, o casamento de Carlos se tornou, por assim dizer, "inadiável", toda a gente
se riu com o sarilho em que o desgraçado estava metido. Onde iria ele descobrir tal
raridade? E quem seria ela? Foi Diana Spencer, uma jovem bonitinha, quase adolescente
e pouco esperta, à volta de quem logo se inventou, para consumo dos media, uma
história de amor melada e absurda.
O casamento, claro acabou mal. Carlos, coitado, que também não era uma grande cabeça,
ao menos percebia o seu papel na ordem constitucional e na vida política. Diana queria ser
célebre e queria ser feliz, como qualquer pequeno-burguesa analfabeta e ambiciosa,
ensopada no sentimentalismo popular do tempo. Começou então o espectáculo de uma
alta personagem do Estado, que pouco a pouco se transformou numa pop star e que os
media naturalmente tratavam como uma pop star. Andava lá tudo: grandes costureiros,
actores de cinema, jogadores de rubgy, "jornalistas" de escândalo, o inconcebível Elton John
e a bulimia da praxe. No meio disto, Diana, que romanticamente se achava "natural"
e era de facto uma exibicionista indiscriminada e louca, pedia por favor a privacidade que
ela própria anulara.
Com o divórcio e a querela com a Monarquia (um caso de puro ressentimento) veio a segunda
encarnação de Diana na figura clássica do "anjo de caridade", muito habitual nas
rainhas do século XIX. Visitou leprosos, drogados, doentes com sida; e passeou por Angola
a fingir que desarmava minas. Mostrou aí um talento particular para o estilo touchy-feely,
que disfarçava a irrelevância do exercício e comovia o público. Blair aproveitou a inspiração
e fez dela uma improvável "princesa do povo". Do povo da televisão e dos tablóides, com
certeza. Não por acaso os filhos comemoraram a morte da mãe em Wembley, com um
concerto rock. Ninguém representou como ela e egocentrismo, a vulgaridade e a
superficialidade da época, de certa maneira, a cultura da democracia liberal em que vivemos."
Há uns anos, Vasco Pulido Valente, disse esta frase numa entrevista ao Público.
"(...) Sempre pensei na vida como se fosse um funil. As pessoas começam nas bordas do funil, têm imensas possibilidades e depois, à medida que envelhecem, o círculo é cada vez mais pequeno, até que saem pelo cano fora... As possibilidades estão todas lá, ao princípio. Mas a vida é mesmo uma diminuição das possibilidades. As pessoas têm sempre de escolher e quando escolhem, perdem sempre alguma coisa."
Quando li esta frase, pensei na minha vida e fiquei deprimido...